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30 agosto 2009

OTELO por William Shakespeare


Ato 5, Cena 2 [excerto]
Essa cena inspirou um improviso entre Zoey e Erik em Untamed

Cena II
Um quarto de dormir, no castelo. Desdêmona dorme, no leito. Uma candeia acesa. Entra Otelo.
OTELO - Esta é a causa, minha alma. Oh! Esta é a causa! Não vo-la nomearei, castas estrelas! Esta é a
causa! Não quero verter sangue, nem ferir-lhe a epiderme ainda mais branca do que neve e mais lisa que
o alabastro. Mas é fatal que morra; do contrário, virá ainda a enganar mais outros homens. Apaga a luz!
Depois... Apaga a luz! Se te apagar, ministro flamejante, poderei restituir-te a luz primeira, se vier a
arrepender-me. Mas extinta que seja tua luz, ó tu, modelo primoroso da excelsa natureza! de onde o fogo trazer de Prometeu, para dar nova luz à tua chama? Se tua rosa colher, é-me impossível o vital
crescimento restituir-lhe: fatal é que feneça. Vou aspirá-la no próprio galho. (Beija-a.) O hálito aromoso,
que quase a convencer chegaste a própria Justiça a espedaçar a sua espada! Mais um! Mais um! Se assim
ficares, morta, quero tirar-te a vida, e, após, amar-te. Mais outro; será o último; um tão doce jamais foi
tão fatal. Chorar preciso lágrimas impiedosas; é celeste meu sofrimento, pois castiga ao que ama. Vai
acordar!
DESDÊMONA - Quem está aí? Otelo?
OTELO - Sim, Desdêmona.
DESDÊMONA - Não vindes para o leito, meu senhor?
OTELO - Desdêmona, rezastes esta noite?
DESDÊMONA - Oh, decerto, senhor!
OTELO - Se vos lembrardes de alguma falta não perdoada ainda pelo céu e sua graça, cuidai logo de
tê-la redimida.
DESDÊMONA - O meu senhor! Que pretendeis dizer com isso?
OTELO - Bem; fazei o que vos disse e sede breve. Passarei nesse em meio; não desejo trucidar-vos o
espírito manchado. Não pelo céu! Não vos matarei a alma. DESDÊMONA - Quê! Falais em matar?
OTELO - Sim, é isso mesmo.
DESDÊMONA - Então que o céu de mim tenha piedade.
OTELO - Amém, de coração.
DESDÊMONA - Se assim falais, é que não pretendeis matar-me agora.
OTELO - Hum!
DESDÊMONA - Contudo, sinto medo, pois terrível sois sempre, quando revirais os olhos dessa maneira.
A causa desse medo, não sei dizê-lo, pois não sou culpada; porém sinto que tenho muito medo.
OTELO - Pensa nos teus pecados.
DESDÊMONA - Só consistem no amor que vos dedico.
OTELO - Pois por ele vais agora morrer.
DESDÊMONA - É contra a natureza dar a morte a alguém por ter amor. Ah! Por que causa mordeis o
lábio assim? Toda a postura tendes ora abalada, por alguma sanguinária paixão. E mau agouro; contudo
espero, espero que nenhuma ameaça me comine.
OTELO - Paz e aquieta-te.
DESDÊMONA - Estou quieta. Que é que há?
OTELO - O lenço que te dei, que eu tanto amava, a Cássio o deste? DESDÊMONA - Não, por minha vida, por minha alma, não o dei. Mandai chamá-lo e interrogai-o. OTELO - Juízo, querida alma, não jures falso, pois estás agora no teu leito de morte. DESDÊMONA - Sim, no leito, mas não para morrer. OTELO - Sim, neste instante. Assim, confessa francamente a culpa, pois se com juramentos contestasses ponto por ponto, em nada isso alterara ou sustara o propósito em que me acho e que gemer me faz. Urge que morras. DESDÊMONA - Que Deus de mim se apiade.
OTELO - Digo amém.
DESDÊMONA - Sede também piedoso. Em toda a vida jamais vos ofendi. Nunca amei Cássio, só lhe
tendo dicado essa amizade que o céu permite, e nunca o presenteei.
OTELO - Pelo céu, vi meu lenço na mão dele. Mulher perjura, em pedra me transmudas o coração e o
nome dás de crime ao que eu pensava ser um sacrifício. Vi o lenço! Eu mesmo!
DESDÊMONA - Então, é que ele o achou. Nunca lho dei. Mandai chamá-lo, para vir confessar o que há.
OTELO - Já confessou.
DESDÊMONA - Confessou quê, senhor?
OTELO - Que te possuiu.
DESDÊMONA - Como? Ilicitamente?
OTELO - Sim.
DESDÊMONA - Absurdo! Não dirá isso.
OTELO - Não, porque tapada já tem a boca, pois o honesto Iago tomou suas providências.
DESDÊMONA - Oh! Meu medo tinha razão de ser! Então, morreu?
OTELO - Se seus cabelos todos vivos fossem, minha grande vingança os devorara.
DESDÊMONA - Ai de mim! Foi traído e estou perdida!
OTELO - Sai, prostituta infame! Vais chorá-lo na minha frente?
DESDÊMONA - O meu senhor! Bani-me de vossa vista, mas deixai-me viva.
OTELO - Para trás, prostituta!
DESDÊMONA - Hoje, não; amanhã! Deixai-me viva!
OTELO - Se resistires...
DESDÊMONA - Meia hora apenas.
OTELO - Não há trégua; está feito.
DESDÊMONA - Ó tempo, apenas, de rezar uma vez.
OTELO - É muito tarde.
(Asfixia-a.)


Tradução e Adaptação: Aninha

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